Travessa Hum
Gostaria de morar na Travessa Hum, lá no bairro da Conceição. E quando entardardecesse e o sol descambasse, derramando sombras nostálgicas sobre o meu coração, me assentaria na porta da cozinha para apreciar nuances multicores, e sentir no mais fundo da alma, toda a paz do momento mágico de todos os dias. Tomaria um café gostoso e a cada gole, traria para mais perto de mim, tantas pessoas queridas que já partiram, mas que basta um pôr-do-sol para trazê-las para junto de nós. Lá na Travessa Hum estaria cara-a-cara com o meu passado. Um passado em forma de pedra. Acho que nas entranhas desta pedra, estão armazenados todos os corações daqueles que o destino não concebeu a graça de permanecer aí. Na Travessa Hum eu seria feliz.
Todo aquele que daí nunca precisou sair, guarda dentro de si um arsenal de ventura sem o saver, tem no coração todas as bênçãos que a vida nos pode proporcionar. Os que daí saíram em busca de ' dias melhores' alguns talvez, possam ter encontrado ' estes dias' passando toda sorte de agruras, conseguiram algum bem material, mas na maioria das vezes, a alma despedaçou de encontro às muralhas das dificuldades. Morreram e foram enterrados em terras distantes. Não serão lembrados, serão apenas mais uma cruz anônima no aconchego das nossas massas graníticas ...
Lá na Travessa Hum , ao amanhecer ou entardecer, sentiria no rosto a brisa suave, e quem sabe? O cheiro de lírios, e estaria com o coração cheio de paz, e com todos aqueles que partiram, e com os que ficaram em torno de mim.
Erasmino Rodrigues , in Plagas Remotas - 13/03/98
fotos de Obed R. Souza em Janeiro/2008
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